Quarta-Feira de Cinzas
Um poema alegórico inspirado em festas de Hollywood, rituais macabros, um filme de Kubrick, e outras coisas que podem fazer minha conta cair...
🚩🚩🚩[viewer discretion is advised]🚩🚩🚩
Quarta-feira de Cinzas
Era costume em minha vila prestar respeito ao Deus de Barro, que meus avós já adoravam na madrugada de meu povo. Maravilhada, fui crescendo com o coro rude dos profetas, de barba suja e dentes podres, e nos escritos ancestrais que mãos primevas imprimiam (de tal trabalho, a tinta sangue), como quisessem dar às grutas lição de espécie: aqui há homens. Então chegou meu próprio tempo: beijei os pés do Deus de Barro e a boca podre dos profetas, e me vestiram em mantos brancos. E dei adeus ao pai e à mãe. Como em oração, fiz libações, bebi do ventre o próprio sangue, e dormi noites ao sereno. Na madrugada assim soturna, ouvi frenéticas canções (tal que pungissem as sirenas, cornos de faunos sodomitas); A flauta de Pã tocou mais forte, e meu vestido era vermelho, como um salgueiro incinerado, se derramando em fogo impuro: Como oferenda fui levada, rasgaram vestes, me marcaram com ferro em brasa e ervas finas: — os meus dois lábios costurados. Já um profeta atrás do outro foi profanando a carne em brasa, com lábios rubros, riso histérico; do altar fui solta, descartada. E vi queimar antes da aurora como de um ventre de um bezerro, todo de bronze, prata e ouro, este meu corpo, a carne e ossos. Foram dançando ao meu redor estes profetas consagrados, com espartilhos de rainha, brincos de pérola, berloques: Quando o que eu tinha era só cinzas, o Sol nasceu, manhã de nuvens, e estes profetas extasiados dormiram o sono de um justo.
Se vocês se sentiram mal, meu trabalho está feito.
Brian.